THE MODERN AGE
Os três rapazes corriam tanto que sentiam que seus joelhos se desmontariam, seus pulmões explodiriam e o pior de tudo – que aquele homem de quarenta e poucos anos, gorducho, forte e surpreendentemente rápido os alcançaria e faria um belo estrago em pelo menos um deles. Apesar de estarem em maior número, não se atreveriam a tentar ser páreo para ele, ainda que em um ataque coletivo. Ele era um policial, e os três já tinham sentido nos próprios rostos e costas e braços e pernas os efeitos de um homem da lei em fúria.
E correndo eles sabiam que aquilo logo ia acabar, pois alguém haveria de se cansar - e que esse alguém fosse o gorducho; apesar de os três serem jovens, já eram fumantes há algum tempo e vinham de uma noite agitada, regada a substâncias não-ortodoxas e álcool. No entanto, o crime às vezes compensa, e era por isso que corriam tanto e arriscavam ir parar numa delegacia suja e ávida por rostinhos e rabos jovens como aqueles. Um menino que gosta de rock é capaz de fazer muita estupidez, inclusive entrar em uma loja e roubar um disco de apenas três músicas.
Aquele compacto em vinil era uma raridade de uma banda que os três amavam, em razão proporcionalmente inversa ao ódio que tinham pelo dono da loja, que nem gostava daquele tipo de música, tratava mal os meninos e vendia discos que ficavam por anos nas prateleiras a preços absurdos; mas como saber que aquele idiota, que por acaso passava em frente à loja na hora em que Juliano enfiou o disquinho dentro da jaqueta enquanto Beto e Fabrício lhe davam cobertura tentando puxar papo com o dono, era um guarda à paisana? O dono VIU o rapaz roubando o disco e gritou: “Ei, o que você tá fazendo, seu filho da puta?!” E Juliano saiu correndo, e Beto e Fabrício foram atrás do amigo, e o dono da loja gritava “Ei! Vocês tão junto com esse viado!! Pega ladrão! Pega! PEGA!” E o cara que estava passando decidiu pegar. O susto de Fabrício e Beto foi tão grande que em poucos metros ultrapassaram Juliano, que era quem estava com o fruto do roubo; e ele se viu em situação tão ruim que chegou a pensar em jogar o disco no chão, mas sabia que nunca iria se perdoar por ter dispensado tal item, assim como provavelmente os outros dois ficariam por muito tempo com raiva dele.
O policial começou a gritar “Parem que é a polícia, filhos-da-puta!” Foi assim que eles tiveram certeza de que ele era um verdadeiro perigo, causando nos três um incrível efeito de aumento de velocidade e resistência física. As poucas pessoas que estavam na rua àquela hora os olhavam, com algum interesse, mas tudo acontecia tão rápido que não ficavam observando por muito tempo.
Ao chegarem à esquina, os três fugitivos viram que o sinal acabara de ficar verde para os carros, mas mesmo assim não pararam, e num instante, em meio às buzinas dos carros que iam avançando, atravessaram as quatro pistas da avenida. No momento em que pisaram na calçada, ouviram um barulho seco de batida. Olharam para trás e viram o homem que os caçava estendido alguns metros à frente completamente coberto de sangue. Os três se olharam e, assustados, continuaram andando, sem se falar, até o apartamento de Fabrício, que ficava a algumas quadras dali. Quando chegaram lá, passaram a tarde ouvindo as três músicas do disco, fumando e tomando vinho barato da avó de Fabrício. E decidiram, juntos, dar um tempo de ir para aqueles lados do centro.