EU NÃO GOSTO DE ENCRENCAS, MAS ELAS GOSTAM DE MIM.

segunda-feira, março 17, 2008

ESTEVÃO E PRINCESO

Nem eu nem ninguém acreditou quando Estevão saiu andando por Curitiba sobre Princeso, seu elefante. Ele dizia que ia ganhar dinheiro vendendo o estrume do animal como adubo para os jardins das casas.
“Ô, madame! A senhora não sabe a força que a bosta desse bicho tem. Vai fazer essas rosinha miudinha da senhora ficar campeã! A senhora vai ver só!”
A madame então ria e dava ao homem uns trocados, um sanduíche, mas dispensava a mercadoria; às vezes Estevão ganhava uma sacola de mimosas, cujas cascas e sementes ele jogava e cuspia nas crianças que o seguiam, pulando e gritando. Ele então fazia sinal de positivo ou de paz e amor à maneira do Didi dos Trapalhões, sorrindo com seus pobres dentes e agitando sua barba e cabelos longos, sujos e emaranhados.


Eu conhecia Estevão do circo que se instalara perto da minha casa. Era um circo pobre, de leões magros e palhaços bêbados. Ele cuidava dos bichos, principalmente do elefante que fazia uma meia dúzia de truques, devorava uma quantidade assustadora de comida e defecava montes impressionantes. E Estevão também era figura que chamava a atenção: baixo, atarracado, pele queimada de sol e os seus cabelos e barbas longos; desses últimos, ele dizia:
“Meu sonho é ver meu cabelo arrastando no chão, mas acho que vai cair tudo antes”, e apontava o cocuruto de cabelos rareando, enquanto ria mostrando os polegares de positivo.
Nessa época, a mulher do dono do circo fugiu com um dos palhaços levando o melhor trailer – que estava em seu nome – e todo o dinheiro do circo. Falido, e principalmente, desiludido do amor, o dono do circo disse a cada um dos integrantes para pegar o que quisesse, pois ele não tinha mais com o que pagá-los, nem queria mais saber do circo. Estevão ficou com Princeso – O Maravilhoso Elefante Adestrado.
Na segunda semana de Estevão com o elefante andando pelas ruas, depois de aparecer na TV em entrada ao vivo e em rede estadual ao meio-dia, e à noite em cadeia nacional, o Ibama recolheu o elefante e a polícia prendeu Estevão por posse de animal selvagem sem licença. O delegado, penalizado com a miséria do homem e seu desespero com a situação, manteve-o na delegacia sem colocá-lo em cela nem algemá-lo por um par de horas, para então liberá-lo.


Princeso acabou indo para o zoológico do Rio de Janeiro, para tornar-se o orgulhoso pai de um par de elefantinhos. Por conta disso, Estevão apareceu novamente na TV, sendo preso tentando entrar no lugar onde o amigo estava. Dormiu dois dias numa cela, foi liberado e desapareceu por muito tempo. Há alguns meses, um vizinho meu disse que o viu num circo no interior, sorrindo e fazendo sinal de positivo para um grupo de crianças que o cercavam, enquanto enchia um carrinho de mão com excrementos de elefante.

(para o meu sobrinho Marcello)